Onde estamos?

Publicado em 24 de maio de 2016

O jogo está sendo roubado. Ao começar, o juiz toma a bola e entrega ao adversário. Quando o time da situação rouba a bola, é sinalizada a falta. Quando o time da oposição bate tiro direto, de qualquer distância, é feito sem barreira. É inútil ao time que representa os interesses da maior parte da população ir ao ataque, posto que em todos são declarados impedimentos.

Os narradores torcem muito à vontade para o time da elite, protegido pela Corte Suprema em campo. Valorizam ao máximo as iniciativas da equipe da oposição, na mesma medida que são intermináveis e dramáticas as críticas à mínima falta cometida pelo time da situação. Nunca comentam as escabrosas faltas da oposição, solenemente ignoradas por ambas as instituições, a legal e a midiática.

Já as faltas da situação, mormente acusadas erroneamente pelo “seu juiz”, recebiam uma longa e detalhada atenção na narrativa, com direito a enquete entre os torcedores sobre o destino do jogador faltoso e uma cirúrgica edição de vídeo, de forma a parecer que o jogador do time da situação fez uma falta hedionda contra o adversário.

A dor de estar num jogo absolutamente roubado, só não é pior quando a torcida joga contra o próprio time e não protesta contra as injustiças. É o desterro. Mas, ela estava lá, naquele monumental e novo estádio, embevecida da festa que participava naquela modernidade gigante e cheias de opções coloridas, saborosas e supérfluas para consumir. O jogo roubado, formalmente revestido de legalidade, caminhava para os seus estertores.

A torcida, para o desespero do time roubado, conformada com as imagens editadas e com a razão dos comentaristas, manifestava-se sempre com vacilante desconfiança e desapreço para com a situação e com apreço para com a oposição editada pela mídia hegemônica e tendenciosa.

O povo, o que pode ir ao estádio, se pejou na presença maciça da classe média consumista e supérflua, mas que nunca soube o que é torcer pelo seu time num estádio lotado. Confuso e iludido pela retórica rebuscada e vazia da elite e pelo supérfluo colorido e saboroso da festa, o povo deixou seu time, aquele que lhe abriu as portas dos estádios, ser ignominiosamente roubado. Diria, talvez, José Murilo de Carvalho: “assistiu a tudo bestializado”.

A situação não era, de fato, uma surpresa para a maior parte das pessoas que participou, intestinamente da construção destes últimos 13 anos à frente do campeonato. O provincianismo, a truculência e o botocudismo da elite brasileira são mundialmente conhecidos. De elite mesmo, poder e/ou fortuna. Nenhuma legitimidade intelectual e/ou política. Do outro lado, tem-se uma população secularmente faminta de comida e de inserção social com um mínimo de condições dignas de competir de igual para igual no campo da meritocracia.

Na noite de 13 de maio, um dia após a consolidação do golpe e uma bela sexta-feira, os bares estavam cheios de povo. Num deles, observei os consumidores de todas as mesas fazerem um bailado com os braços ao ar, enquanto cantavam uníssonos com a dupla que estoura os tímpanos de qualquer pedra. O sucesso era de um dos períodos mais cruentos da ditadura militar, os anos 1970. A música se chama Moça, e o autor, Wando. “Querooooo me agarrar nos seus cabelos…”.

Vivemos uma ditadura pior que a de 1964. É a ditadura do Judiciário. Judiciário não quer dizer exatamente Justiça. É a ditadura da judicialização e criminalização da política. Todo e qualquer ato político pode e será criminalizado. Estudantes ocupam a Casa do Povo para exigir uma CPI sobre uma das formas mais antigas e rasteiras de corrupção, o desvio de merenda escolar. O ato político foi criminalizado e os estudantes ameaçados pelas forças de segurança do Estado. Estudantes ocupam uma escola para exigir o óbvio, eleição direta para diretor de escola, e são criminalizados e tratados como bandidos pelas forças de repressão a serviço do Estado.

O Judiciário, em parceria com seletivos órgãos de fiscalização e controle, age com poderes absolutos sobre os destinos das pessoas e da nação. Apontado por praticamente todos os países e pela imprensa do mundo como um golpe de estado revestido de legalidade, todo o processo de afastamento da presidenta Dilma Rousseff foi corroborado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A maior expressão do escárnio do consórcio entre STF e os referidos órgãos foram as mais recentes decisões da Suprema Corte e da Procuradoria Geral da República (PGR), sobre o senador Aécio Neves (PSDB/MG). Ele foi citado em mais de meia dúzia de delações premiadas e em relatórios reconhecidos pela Polícia Federal (PF), em que figura como destinatário de repasses irregulares de valores milionários desviados de Furnas Centrais Elétricas e maquiagem de dados do Banco Rural.

O PGR, Rodrigo Janot, encaminhou ao STF, no início de maio, autorização de abertura de inquérito contra o tucano presidente do PSDB. Em um gesto de absoluto deboche com a Justiça e com a nação, um dos CNPJs do STF, o ministro Gilmar Mendes, determinou, em 11 de maio, a abertura de inquérito contra senador tucano. E, em menos de 24 depois, o mesmo CNPJ do STF determina à PGR o arquivamento de qualquer investigação contra o intocável político do PSDB.

Em 17 de março, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, contra quem não pesa uma única condenação, foi impedido de tomar posse como ministro da Casa Civil do governo Dilma. Em 13 de maio, o conspirador golpista Michel Temer (PMDB/SP) nomeia sete ministros contra os quais pesam inúmeras investigações e acusações de corrupção. Envolvidos, inclusive, com as mesmas empreiteiras investigadas na Operação Lava Jato.

A PGR e o STF, até o momento, não se manifestaram sobre as nomeações do governo golpista.

Enio e Lula

Vem com a gente

Lula e Dep. Federal Enio Verri

Faça parte da rede de defesa dos DIREITOS SOCIAIS e pela DEMOCRACIA.

Enviar mensagem
Vamos conversar?
Olá!
Envie sua mensagem para o deputado Enio Verri.