Publicado em 6 de outubro de 2017
Folha de S.Paulo
A recuperação da economia continua em marcha lenta, mas já parece suficiente para ajudar o governo Michel Temer na “compra” de apoio parlamentar para barrar as denúncias de corrupção.
Duas semanas atrás o governo liberou R$ 13 bilhões de recursos que estavam reservados para a meta fiscal, ganhando uma folga para aprovar emendas de deputados.
Agora parece ter jogado a toalha na queda de braço com o Congresso sobre o Refis, novo programa de parcelamento de dívidas tributárias aprovado pelo Senado, que seguiu para a sanção presidencial.
Quando editou a medida provisória, a equipe econômica calculava arrecadar R$ 13 bilhões com o Refis, mas reduziu esse número para R$ 8,8 bilhões na última revisão orçamentária.
Com as reduções de multas e juros mais generosas aplicadas pelos parlamentares, não deve chegar nem a isso. Pouca gente séria hoje arrisca uma previsão, mas isso deixou de incomodar o governo, que foi surpreendido por notícias favoráveis.
A arrecadação teve um salto de 10,8% em agosto em relação ao ano anterior, já refletindo o aumento da carga tributária sobre os combustíveis e a recuperação da economia. Além disso, a concessão das usinas da Cemig e o leilão dos blocos do pré-sal renderam mais que o esperado.
O economista Braúlio Borges, da LCA Consultoria, calcula um deficit de R$ 155 bilhões neste ano, portanto, abaixo da meta de R$ 159 bilhões, sem contar com um centavo do desidratado programa de parcelamento de tributos. “O Refis se tornou muito mais importante para o governo negociar apoio no Congresso do que para a arrecadação.”
Evidentemente qualquer folga orçamentária em um país desigual e carente de infraestrutura como o Brasil seria mais bem utilizada em outros fins do que na “compra” de apoio parlamentar para manter Temer no poder.
Além disso, a política miúda esconde um debate muito mais importante sobre o Refis. Sucessivos parcelamentos tributários desde o início deste século —praticamente um Refis a cada dois anos— vêm incentivando as empresas a não acertar suas dívidas com o governo.
Por outro lado, as pesadas penalidades impostas pela Receita transformam débitos em atraso em contas impagáveis se não houver algum alívio. Matéria desta Folha mostrou que multas e juros chegam a representar 70% de uma dívida tributária após dez anos de atraso.
A situação hoje é um perde-perde: perdem as empresas, que sem regularizar suas dívidas têm dificuldades para se financiar e conseguir clientes, e perde a União, que não recebe o que é devido.