O governo das capitulações

Publicado em 12 de fevereiro de 2019

O governo Bolsonaro dá mais uma clara demonstração de que foi eleito sem um programa. O novo recuo deu-se após o Ministério da Economia não renovar a taxa antidumping aplicada ao leite em pó, desde 2001. Depois de assistir ao estrago exposto na imprensa e nas redes sociais, com manifestações dos produtores, tanto do agronegócio, quanto da agricultura familiar, o presidente determinou que o ministro revisse a decisão, tomada na sexta-feira (8). Os sentimentos gerais, desde os produtores, aos comerciantes, passando pelos consumidores, são de apreensão e temor. A sensação é a de que o recém-nascido governo não tem ideia do que está fazendo. Agora, depois do estresse dos mercados interno e externo, passa-se ao constrangimento de retroceder da decisão.

A imagem passada é a da insegurança quanto aos rumos que o Brasil deva trilhar para superar a crise econômica e o desemprego. A não renovação da tributação simplesmente arrasaria o mercado interno. A medida protetiva adotada pelo Brasil foi estabelecida de acordo com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). O período em que vigeu não foi o suficiente para fazer frente às subsidiadas e protegidas produções da U.E. e da Nova Zelândia, duas referências mundiais na fabricação de leite em pó. Todos os anos, a produção da U.E supera as expectativas de consumo interno, fazendo-a despejar o excedente em outros países, a um custo completamente fora da possibilidade de competição interna.

Estima-se que a UE tenha cerca 250 mil toneladas de leite em pó estocadas, em busca de um mercado consumidor. Caso o ministro Paulo Guedes não revogue a decisão, o Paraná será um dos estados mais prejudicados. Trata-se do segundo maior produtor de leite do Brasil, depois de Minas Gerais. Anualmente, dos 35 bilhões de litros de leite produzidos no Brasil, o Paraná responde por 4,6 bilhões, ou 13,5% da produção nacional. Em todo o Brasil, há 1,7 milhão de produtores da agricultura familiar. Portanto, os mais prejudicados serão os pequenos, que mais empregam. Porém, as grandes indústrias também serão duramente penalizadas por uma concorrência desleal, estimulada pelo próprio governo, que as expõe a um risco capital.

É difícil saber o que é pior para o Brasil, se um governo que destrói suas indústrias, sua produção de matéria-prima e submete sua economia ao desenvolvimento de outros países, ou um governo vacilante quanto o que projeta para o País e, a toda pressão, capitula decisões complexas que envolvem a produção nacional, com consequências deletérias para o mercado de trabalho de um País onde há mais 13 milhões de desempregados. Bem diferente de países como os da U.E., os EUA, ou o México, que protegem o seu mercado interno, criando barreiras fiscais, fitossanitárias e burocráticas, que impedem a inserção de concorrentes estrangeiros em seus territórios. Definitivamente, esse não é o caminho para convencer investidores estrangeiros de que o Brasil é um bom lugar para se investir, sob um governo tíbio, sem comando e sem projetos estruturados.

A sociedade brasileira deve observar o que está acontecendo e se posicionar diante dessas situações que colocam o País em condição de presa fácil para indústrias mais avançadas. O debate está posto e deve ser encarado por todos os brasileiros interessados no desenvolvimento soberano e altivo do Brasil. A soma das tarifas antidumping e o imposto para importação de leite em pó, da U.E. e da Nova Zelândia, totaliza 42,8% e 31,9% respectivamente. Países, como México, por exemplo, tributam em mais de 100% a importação de laticínios, como forma de afastar concorrência de países cuja industrialização está muito à frente da competitividade dos produtores locais. Apesar do desnivelamento de concorrência, os governos não jogam os produtores aos leões.

Enio Verri é deputado federal pelo PT e professor licenciado do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Maringá (UEM).

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